Jamais havia lido ou visto trabalho algum de Tennessee Williams, e fui começar logo com o que é considerada sua obra-prima: "Um bonde chamado desejo".
Na peça, Blanche DuBois é uma professora de inglês vinda de uma tradicional família do Sul dos EUA. Após perder a fazenda da família, ela vai passar uns tempos na casa da irmã Stella, casada com o operário Stanley Kowalski. O choque de culturas entre a aristocrática Blanche com o cunhado grosseirão é o que dá a tônica para toda a peça, com Stella se desdobrando para representar um ponto de equilíbrio entre personalidades tão opostas. A tensão do relacionamento entre os três vai num crescendo até que revelações sobre a vida pregressa de Blanche forçam o clímax da história.
Vivien Leigh como Blanche e Marlon Brando como Kowalski no filme de 1951*
Difícil discorrer sobre "Um bonde chamado desejo" sem estabelecer comparações entre o autor e Nelson Rodrigues: são estilos narrativos muito parecidos, o mesmo apreço pela temática do conflito pessoal e familiar, o desejo sexual como forma de punição para a mulher (mas de extravasamento para o homem), etc. Em vários momentos da leitura, eu podia ver relações com peças rodriguianas como "A falecida", "Bonitinha, mas ordinária", só para citar algumas.
Escrita no final da década de 1940, na América do pós-guerra, "Um bonde chamado desejo" retrata a mudança de valores que esse período da história trouxe para a sociedade americana - especialmente numa região tradicional como a Nova Orleans, que, na época, vivia uma efervescente cena de jazz e blues.
Avaliação: quatro de cinco estrelas, porque a história é datada [e ainda prefiro Nelson Rodrigues].
P.S.: chama a atenção o fato de haver apenas um personagem não-branco que tenha nome (Pablo, parceiro de carteado de Stanley). A vizinha negra ganhou o nome de "Mulher Negra". A vendedora de flores é a "Mexicana". Reflexos do preconceito racial da época, talvez?
*Por algum motivo que ignoro completamente, o filme recebeu o título em português de "Uma rua chamada pecado".